Um manifesto sobre um amor bem feio
Abaixo a poesia!
Abaixo o Romantismo!
Abaixo a beleza triste das virgens inalcançáveis!
Abaixo, acima de qualquer outra coisa, o amor platônico!
Procuro um amor real, pós-moderno, uma mistura entre contemporaneidade e naturalismo clássico: desejo carnal, tensão sexual, palavras sussurradas por vozes roucas ao pé do ouvido. Onde assino contrato? Enfrento um pilha de burocracia em papeladas, para começar, desde já, a pôr em prática minha teoria. Experiências envolvendo beijos molhados e mordidas violentas que terminem, sem mais nem menos, em declarações de amor dignas de novela das 9. Mexicana. Mais melosas que amigas da mãe com seus como-você-cresceu e te-carreguei-no-colo, em visitas tão inesperadas quanto desconfortáveis.
Cansei. Cansei da beleza do quase, da incerteza do quando, da afabilidade do talvez. Eu quero um amor bem feio, mas tão feio que nem precise de eu te amos e anéis de compromisso. Quero um amor-clichê, que não chegue a merecer sequer um curta numa dessas compilações das grandes cenas românticas da década. Um amor normal, de gente que briga e chora, mas não desentrelaça os dedos. Quero enlaçar e desenlaçar dedos, dias, braços e bocas, numa mistura tão homogênea que transforme dois em um. Um buquê entregue em plena aula, cafona como o cartão anexo ao laço cor-de-rosa.
Larguei. Larguei esse punhado de coisas que nunca vieram, para ter força para aguentar o peso das coisas que estão aqui, ou que ainda estão por chegar. Não vou esperar, nem mais um segundo, por você, por nós, por quases e amores despedaçados pela poesia. Agora, que venham as coisas concretas, daquelas que quebram se escapulirem das mãos e machucam se caírem bem em cima do dedo mindinho do pé.
Liberto agora todas as substâncias ligeiramente translúcidas que se solidificam por um tempo, para, logo depois, perder-se no ar. Já basta de dar ouvidos ao Pequeno Príncipe – o que sabia ele, afinal? Ele podia sentir a sua rosa, cuidar da sua rosa, ela era real! – e de julgamentos sobre a desconfiança do pobre São Tomé: a partir de hoje, eu só acredito vendo. Avancei meia dúzia de passos e ainda posso enxergar seu reflexo pelas vitrines nas ruas, mas não diminuirei o ritmo.
O inverno está para chegar e eu prometo não correr: há tempo. Ainda há. Amanhã, não se sabe, já diria sabe-se lá qual banda, em uma música de cujo nome não sei.
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Foto por Theo Gosselin.
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